A história do fermento é a seguinte: na semana passada estava com vontade de tentar um pão mais complexo e fui atrás essa receita que já estava marcada para ser feita a bastante tempo. Como a vontade de fazer o pão era grande, mas alguma coisa deve ter desandado no meu dia, o pão não ficou bom, não passou nem perto do que experimentou a autora da fonte consultada com o seu pão quase sourdough. Pior que levei o dia inteiro fazendo o fermento e o pão. Comecei pela manhã e fui assá-lo já eram umas sete da noite.
Nem tudo se perdeu nessa história, porque um pão ruim pode virar várias coisas além de peso de papel e lixo orgânico. Ainda mais que no meu caso, comida alguma feita deliberadamente vira lixo orgânico impunemente, salvo casos em que a coisa queima ou estraga [o que nem me lembro a última vez que aconteceu]. O pão foi comido como tal, em seu estado acabou de vir ao mundo na forma de pão, mas também como torrada, crouton de salada e brusqueta. A parte isso tudo, a melhor sobra do pão foi o fermento que não foi usado por completo na receita. Ficaram lá indefesos e solitários exatos 100 gramas de fermento feitos, tudo bem, a partir do fermento biológico industrializado, mas certamente evoluído pelas longas 6 horas que ficou levedando.
Essa pequena parte de massa ficou na geladeira esperando sua oportunidade de virar alguma coisa de comer. Como um fermento como esse trabalha lentamente na tarefa de fazer a massa crescer, o tempo que só dispomos com propriedade nos fins de semana foi crucial para que "aquilo" que estava na minha geladeira pudesse se transformar na melhor pizza já feita em todo esse tempo vivendo neste lar que, convenhamos, foi sempre de muita pizza caseira.
Primeiro tinha que saber se a cultura de seres que habitavam o fermento ainda estavam vivos e na impossibilidade de perguntar isso a eles tive que misturar a massa disponível 1 colher de sopa de farinha e duas colheres de sopa de água. Isso ainda era quinta-feira à noite. Depois de uma noite descansando e se alimentando - temperatura ambiente - meus fungos começaram a manifestar seu contentamento por estarem bem vivos e pude prosseguir com preparativos necessários para torná-lo incorporável a massa da pizza. O pequeno pote em que ele estava acomodado "acordou" com a massa toda cheia de bolhas e com a tampa levemente suspensa devido a intensa atividade.
Já com os sinais vitais restabelecidos o fermento voltou para a geladeira até a noite de sexta, quando então misturei metade dele [+ ou - 50 gramas] com o seu mesmo peso em água [50 gramas] e o dobro do seu peso em farinha [100 gramas]. Essa espécie de regra de ouro dos fermentos eu retirei do livro Crust do Richard Bertinet e já adianto que haja férias para eu colocar a leitura culinária em dia. 5 livros de papel e mais um monte de textos em PDF.
Tudo isso para chegarmos ao sábado, o dia da pizza. Mesmo parecendo meio insano levar três dias para se fazer uma pizza eu tenho que confessar que o sanatório me espera, já que acho o caminho percorrido tão divertido quanto o destino para onde ele nos leva. Argh! que coisa mais brega!
No sábado de manhã, totalmente disposta a passar o dia na cozinha [mesmo não sabendo que boa parte desse tempo eu ia ficar limpando ela], lá fui eu fazer sorvete e pizza. Não vou me estender sobre o sorvete nesse post, embora a façanha mereça ser contada em outra ocasião. Já a pizza foi amassada com 150g do fermento [as 50 gramas que sobraram eu descartei porque não tenho pretensões panificadoras até depois do natal], 200 gramas de farinha [pesei 250 gramas, mas ficaram 50 gramas na balança], cerca de 125 gramas de água, mas pode ser menos, porque não conferi o que ficou no copo. Além do básico, um pouco de azeite, colocado diretamente sobre a farinha no início, um pouco de açúcar e sal, todos medidos no olho.
Uma vez amassada a futura pizza foi para o descanso de algumas horas, devidamente besuntada de azeite. Devia ser mais ou menos meio dia quando acabei de sovar a massa e por volta das duas da tarde retirei ela do descanso e dei mais uma amaciada, dobrando bem as pontas sobre a massa e fazendo novamente uma bola. Então ficou descansando por toda a tarde até ser moldada e assada por volta das oito horas da noite. Sem dúvida, essa massa foi a melhor que eu já fiz, com o sabor levemente azedo e muito aerada - como é próprio das massas de fermentação longa. A pizza ficou macia, muito macia e foi belamente agraciada com um molho de tomate caseiro, manjericão da horta e mussarela de búfala. Mereceu o comentário, dessa vez proferido por mim mesma: "Pra Itália, só falta o cheiro de mar!". Espero que não pareça pretensioso de minha parte, mas de fato dei até voltas felizes e eufóricas pela cozinha quando mordi o primeiro pedaço. E, como nunca fui à Itália, posso dizer que criei em casa a minha própria versão idealizada que que seria estar lá. Se vai corresponder ou não, é outra história.
Eu confesso, roubei na foto. |
Update [26/12/2011]:
Esse vai ser um update longo...
A foto acima é uma trapaça. Não é a mesma pizza que vem descrita no post. Tudo porque no dia em que a ex-melhor pizza desta casa foi feita a câmera - que já não é lá essas coisas - estava com a bateria a carregar e as fotos que consegui com o celular são impublicáveis, sob o risco de arruinar minha parca reputação culinária.
Só que a pizza que aparece na foto deste post também foi feita por mim, o que ameniza um pouco o grau do delito - eu não peguei a foto de nenhum outro lugar. Ela é, nada mais nada menos, que a nova melhor pizza já produzida nesta casa, com a diferença de apenas uma semana entre uma e outra. É praticamente um recorde. Sem contar que a nova melhor pizza foi feita para o jantar de Natal nesta casa de pessoas pouco ortodoxas.
Comecei a escrever aqui, mas resolvi passar as anotações para um outro post, porque, como sempre, eu não tenho limites quando começo a escrever neste blog. Queria ser assim com meus trabalhos para o mestrado e a dissertação. Como a coisa flui quando o objetivo é a falta de necessidade .
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